Pediculose

(infestação por piolhos)

Autoras: Janete Raad Rigolon, Suely Kirzner

Pediatras e Membros do Comitê de Saúde Escolar da SOPERJ.

Os piolhos são insetos parasitas, responsáveis pela doença chamada pediculose, muito comum e distribuída em todo o mundo. Considerado um dos mais antigos parasitas, piolhos são conhecidos preceder o Homo sapiens por cerca de 1,18 milhões de anos.

Existem três espécies de piolhos de acordo com o local que habitam: o piolho da cabeça (Pediculus humanus capitis), o do corpo (Pediculus humanus corporis), popularmente chamado de ‘muquirana’, e o da região pubiana (Phthirus pubis), conhecido como ‘chato’.  

Crianças de creche, pré-escolar e ensino fundamental, com idade entre 3 a 11 anos, estão entre os mais acometidos, assim como os familiares dos mesmos. O sexo feminino é infestado mais frequentemente do que o masculino. A Pediculose provoca um elevado nível de ansiedade entre os pais de crianças em idade escolar e ao contrário do que alguns pensam, não é um sinal de má higiene. Atinge todos os grupos socioeconômicos. Tem preferência pelo cabelo limpo, não gorduroso e fino. O comprimento do cabelo ou a frequência de escovação não influenciam a presença do piolho, assim como a limpeza da casa ou da escola.

Pediculus humanus capitis possui um corpo alongado e estreito, não pula, nem voa, pode apenas rastejar. Ele se locomove através de suas seis pernas e garras e pode ser encontrado principalmente na cabeça e alguma vezes nas sobrancelhas e cílios de pessoas.

A sua forma de transmissão mais frequente ocorre principalmente através do contato direto (cabeça encostando em cabeça) com uma pessoa que já está infestada e é comum durante jogos (atividades esportivas), parques infantis, acampamentos, festas e “selfs”. Menos de 2% dos casos de piolhos ocorrem através do uso comum de utensílios como escovas de cabelo, bonés, pentes, arcos de cabelo e chapéus; deitar em uma cama, sofá, almofada ou tapete que foi utilizada recentemente por uma pessoa infestada.

Cães, gatos e outros animais de estimação não desempenham um papel na disseminação de piolhos, deixando os seres humanos como sua única fonte de alimento, bem como seu único meio de transporte e difusão de novos hospedeiros.

Ciclo:

Um a dois dias após copular, a fêmea deposita seus ovos (também chamados de lêndeas) de aproximadamente 0,8mm, nos fios de cabelo há aproximadamente 0,6-1cm do couro cabeludo devido à temperatura do corpo humano. O ovo amarelo-esbranquiçado fica aderido firmemente com ajuda de uma substancia gelatinosa que rapidamente endurece. Cada fêmea tem a capacidade de colocar de 150-250 ovos durante seu ciclo de vida, que dura aproximadamente 30 dias A ninfa eclode após aproximadamente 6-9 dias e leva em média mais 7-10 dias para se tornar um adulto fértil.

Longe do couro cabeludo, piolhos sobrevivem menos de 2 dias à temperatura ambiente, e seus ovos, que geralmente, tornam-se viáveis dentro de uma semana, não conseguem desenvolver-se em uma temperatura ambiente mais baixa do que a corporal.

Eles se alimentam exclusivamente de sangue. Tanto as ninfas e os piolhos adultos precisam se alimentar para viver. Se um piolho adulto não tem uma refeição de sangue, ele pode morrer em 2 dias.

Piolhos não são responsáveis por propagação de doenças. A sua presença pode causar uma coceira intensa devido a uma reação de hipersensibilidade ocasionada pelas enzimas da saliva injetada durante a picada. A coçadura pode causar escoriações, que em algumas situações levam a infecções secundárias como impetigo e pioderma. A coceira pode aparecer 1-2 dias após a exposição.

Sinais e sintomas de infestação de piolhos:

  • Muitas crianças podem ser assintomáticas.
  • Sensação de algo se mexendo no cabelo a fazer cócegas.
  • Coceira, causada por uma reação alérgica às mordidas de piolho da cabeça.
  • Irritabilidade e dificuldade para dormir; piolhos são mais ativos no escuro.
  • Feridas na cabeça causada pelo coçar.

O diagnóstico é confirmado pela visualização direta de pelo menos 1 piolho. Achar somente lêndeas aumenta muito a suspeita, mas não fecha a infestação, já que as lêndeas podem ficar grudadas ainda por até 1 mês após tratamento correto. As lêndeas são frequentemente encontradas na região occipital (nuca) e retro-auricular. O fato de estarem bem aderidas facilita sua diferenciação da dermatite seborreica na qual a caspinha consegue ser retirada com facilidade.

Tratamento

O tratamento se divide em duas etapas: Eliminar o parasita adulto e retirar as lêndeas. O parasita adulto pode ser eliminado através do tratamento tópico e sistêmico.

Tratamento tópico mais usado:

Shampoo de Deltametrina ou shampoo de Permetrina: devem ser aplicados no cabelo seco, deixar agir de 5-10 minutos, depois lavar. Ambos atuam sobre o sistema neurológico do parasita causando sua paralisia e morte.

  • O Shampoo de Deltametrina deve ser usado durante 4 dias consecutivos.
  • O shampoo de Permetrina age após uma única aplicação e pode ser repetido após 7 dias caso apareçam novos piolhos resultantes da não retirada das lêndeas.
  • Sabonete e loção de Monossulfiram- usado para lavar o cabelo e depois sob forma de loção deve ser aplicado durante 8h sobre o couro cabeludo. Para adultos na diluição com água de 2:1 e para crianças 3:1. Repetir após 7 das.
  • Benzoato de benzila e Lindano – estão em desuso pela elevada frequência de resistência e ocorrências de efeitos adversos.

Tratamento Sistêmico mais usado:

  • Ivermectina: Este antiparasitário atua causando uma paralisia com posterior morte do piolho adulto. O uso deve ser evitado em pessoas com hipersensibilidade à droga, durante a gravidez, amamentação e em crianças abaixo de 5 anos ou menos de 15 kg.

Eliminação das lêndeas:

Essa etapa é essencial para a eliminação total do parasita, pois apesar de ter eliminado a forma adulta, as lêndeas ainda continuam eclodindo nos 10 dias seguintes. Nenhuma medicação tópica é 100% eficaz. Por isso é recomendada a retirada manual com ajuda do pente fino. Como a lêndea fica aderida ao cabelo, a substância colante pode ser dissolvida por uma solução de vinagre e
água (1:1), facilitando a posterior remoção pelo pente. O pente de metal é mais eficaz para a retirada do que o pente de plástico, pois o espaçamento é menor. O procedimento deve ser repetido por pelo menos 2 semanas até eliminar todas as lêndeas.

Considerações gerais:

Em um estudo publicado no International Journal of Dermatology, demonstrou que o impacto social das contramedidas de piolhos, incluindo o afastamento e excesso de tratamento pode ter um efeito mais prejudicial para os pais e crianças do que a infestação real de piolhos em si.

No entanto, o mito mais duradouro é que a presença de ovos dos piolhos ou "lêndeas" é indicativa de um caso ativo de infestação por piolhos, e que o afastamento dessas crianças das atividades escolares os impedirá de transmitir piolhos aos outros. Infelizmente, quando as lêndeas são descobertas, a criança em questão provavelmente já teve piolhos por mais de um mês, e agora passa pouco risco para os outros.

De acordo com o 2015 AAP, uma criança diagnosticada com piolhos na escola deve permanecer lá. Não há nenhuma necessidade para afastá-la imediatamente. Um telefonema ou uma carta em casa para pais/cuidadores da criança afetada deve delinear os passos para estes procurem um tratamento adequado.

Nenhuma criança saudável deve ser afastada da escola por causa de infestação por piolhos ou lêndeas. pois poderão perder tempo valioso de aprendizado.

Profissionais de saúde devem orientar a comunidade escolar e os pais quanto ao não afastamento escolar devido ao piolho.

A reinfestação é comum e por isso o tratamento simultâneo de todos os acometidos é recomendado.

Manter a privacidade e direito de confidencialidade do aluno é de extrema importância. Crianças devem ser educadas para não compartilhar pentes, escovas, acessórios de cabelo e toalhas.

Os pais precisam saber que não devem utilizar quaisquer materiais potencialmente tóxicos. A maioria dos produtos usados para tratar piolhos pode ser absorvida através da pele. Portanto, todos os medicamentos utilizados para o tratamento devem ser usados com cuidado e sob orientação.

 

Referências Bibliográficas:

Madke B, Khopkar U. Pediculosis capitis: An update. Indian J Dermatol Venereol Leprol [serial online] 2012 [cited 2018 Feb 21];78:429-38. Available from: http://www.ijdvl.com/text.asp?2012/78/4/429/98072

Bragg BN, Simon LV. Pediculosis Humanis (Lice, Capitis, Pubis) [Updated 2017 Nov 17]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2017 Jun-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK470343/

DOI: 10.1542/peds.2015-0746 ; originally published online April 27, 2015; 2015;135;e1355Pediatrics AND COMMITTEE ON INFECTIOUS DISEASES Cynthia D. Devore, Gordon E. Schutze and THE COUNCIL ON SCHOOL HEALTH Head Lice

https://www.cdc.gov/parasites/lice/head/treatment.html

AAP News,vol.36,number 5, May 2015.

Head lice: Misinformation, resistance in the pediatrician’s office, Infectious Diseases in Children, May 2017