A visão constitui um dos principais sistemas sensoriais envolvidos no desenvolvimento infantil. Através dela, a criança explora o ambiente, identifica pessoas e objetos, estabelece relações espaciais e constrói significados. Trata-se de uma função neuroperceptiva aprendida, modulada pela maturação do sistema visual e pela qualidade das experiências sensoriais a que a criança é exposta, podendo sua qualidade ser melhorada com a Estimulação visual.
- Qual a contribuição da terapia ocupacional em crianças com baixa visão?
A Terapia Ocupacional direcionada à baixa visão pediátrica atua na interface entre função visual, função motora e ocupações significativas da criança (brincar, interação social, mobilidade, atividades educacionais e autocuidado). O Terapeuta ocupacional intervém através da estimulação e integração das funções visuais, fornecendo às crianças experiências sensório-motoras adequadas à exploração funcional e ao desenvolvimento global.
- Qual a abordagem utilizada?
A abordagem inicia-se com uma avaliação funcional da visão, centrada em um processo de observação informal do comportamento visual, da qualidade da recepção/assimilação/integração e elaboração dos estímulos visuais em termos perceptivos.
São analisados:
- Processos de recepção visual (atenção ao estímulo, fixação, seguimento ocular);
- Processos de assimilação e integração (capacidade de discriminar, comparar, reconhecer e interpretar informações visuais);
- Resposta perceptiva elaborada (uso do estímulo visual para orientar ações motoras, posturais ou cognitivas).
Essa avaliação não se limita a testes sistematizados: envolve a análise qualitativa de como a criança emprega a visão para interagir com o ambiente e resolver tarefas.
- Como essa avaliação é realizada?
A avaliação funcional investiga o uso da visão nas principais áreas de ocupação:
- Brincar: escolha de objetos, manipulação, organização espacial e orientação visual.
- Mobilidade: exploração do espaço, localização de referências, ajustes posturais e equilíbrio.
- Atividades pedagógicas: leitura, escrita, reconhecimento de formas, símbolos e cores.
- Atividades de vida diária: alimentação, higiene, vestuário e organização do ambiente.
São observadas as funções visuais básicas (fixação, seguimento, campo visual), bem como componentes viso-motores (coordenação olho-mão) e viso-perceptivos (discriminação, constância, memória visual, figura-fundo).
A análise inclui:
- Nível de consciência visual (atenção ao estímulo),
- capacidade de decodificação (atribuição de significado),
- eficiência de uso frente a variáveis como luz, contraste, forma, cor e complexidade ambiental.
- Quais atividades são utilizadas na estimulação visual ?
O planejamento terapêutico é individualizado. O terapeuta analisa cada atividade considerando:
- as exigências motoras,
- o grau de complexidade perceptiva,
- as demandas cognitivas,
- e a etapa do desenvolvimento visual, motor e neuropsicomotor da criança.
É essencial avaliar de forma rigorosa a qualidade e a quantidade das experiências visuais prévias da criança, a fim de evitar tanto a subestimulação, que limita a construção das habilidades perceptivas, quanto a sobrecarga sensorial, que pode comprometer a integração funcional dos estímulos visuais.
Sugestões de adaptações e intervenções terapêuticas com impacto funcional no cotidiano
- Uso de contrastes altos no ambiente: fitas isolantes nas grades do berço, meias listradas (preto/amarelo), capas de mamadeira com contraste, móbiles com cores contrastantes.
- Materiais cotidianos contrastantes: pratos e copos com cores diferentes da mesa para facilitar o reconhecimento visual.
- Exploração multissensorial: brinquedos com texturas variadas, cores vibrantes, alto contraste, luz intermitente ou som.
- Foco dirigido de luz: lanterna em superfícies, objetos e partes do corpo, parede e objetos, para orientar o olhar.
- Variações posturais: berço, tapete ou carrinho, estimulando a criança a reorganizar o campo visual.
Crianças maiores: adaptações pedagógicas
- Cadernos com pautas ampliadas
- Lápis de grafite macio (6B) para maior contraste
- Pranchas inclinadas (facilitam o ângulo de visão e reduzem esforço cervical)
- Tiposcópio (guia de leitura)
- Guias de escrita
Essas adaptações favorecem a eficiência visual, reduzem esforço perceptivo e ampliam a autonomia escolar.
- Papel da família
A participação da família é um elemento central. A continuidade das atividades no domicílio potencializa o aprendizado perceptivo e acelera a consolidação das habilidades. A orientação clara aos cuidadores sobre como organizar o ambiente, selecionar estímulos adequados e encorajar a exploração visual faz parte do próprio processo terapêutico
