A SOPERJ RESPONDE COM FLORES

Caros colegas pediatras,

No dia 27 de julho é comemorado o nosso dia, o dia do médico pediatra. Recordando os fatos das últimas semanas, à primeira vista, parece que não fomos presenteados. Um mês antes, o bebê carioca Arthur havia sido baleado quando ainda na barriga de sua mãe. E uma semana antes do nosso dia, os médicos brasileiros foram acusados pelo ministro da saúde de fingirem trabalhar. Um mês depois de nascido, Arthur falece. Logo depois do dia do pediatra.

Mas vamos nos aprofundar nos fatos.

No dia 30 de junho, segundo publicado no jornal O Globo, “Claudineia foi levada às pressas para o Hospital Municipal Dr. Moacyr do Carmo, na Rodovia Washington Luís, em Caxias, e deu entrada na unidade às 18h02. Os médicos não sabiam, até este momento, se o bebê havia ou não sido atingido. Chefe da equipe médica, a doutora Polliny Batista Pereira estava de plantão desde as 7h. Conta que um obstetra auscultou o coração da criança e percebeu que esta estava sofrendo, com batimento irregular. A decisão de interromper a gravidez foi imediata: às 18h12 a equipe estava no centro cirúrgico pronta para a cesariana, feita em 15 minutos. Sem UTI neonatal, o hospital não teria condições de manter Arthur vivo por muito tempo. Enquanto mãe e filho eram atendidos por equipes diferentes, Polliny e Luiz Carlos Madriaga, responsáveis pelas remoções da unidade, tentavam desesperadamente falar com alguma autoridade do Corpo de Bombeiros – no primeiro contato, a corporação informou que a única ambulância com UTI neonatal disponível em todo o Estado só poderia chegar quatro horas depois. A Secretaria Estadual de Saúde tinha três ambulâncias, mas apenas uma está operando. Arthur nasceu com muito sangue, o dele próprio, que escorria de sua orelha direita, dilacerada, de uma ferida grande no tórax e da cabeça, atingida superficialmente. Os órgãos vitais, para alívio dos médicos e enfermeiros envolvidos, estavam intactos. Foi sedado com 3 mL de fentanil por hora. Assim que o parto foi feito, o médico Luiz Miller, de 36 anos, especializado em cirurgia geral e oncologia, entrou em ação. Ele estava passando pela sala de cirurgia, pronto para ir embora. Em dias normais já teria saído, mas a última operação programada naquela tarde atrasou. Sua mulher e o filho de quatro anos esperavam o médico em casa para jantar. Embora seja cirurgião de adultos, não pediatra, ofereceu ajuda: – Ao perceber o que estava acontecendo, me voltei para a criança. Foi emocionalmente difícil para mim, pois minha esposa está grávida com as mesmas 39 semanas. Poderia ser minha mulher – disse Miller, que trabalha no hospital desde sua fundação, em 2.008: – É uma coisa que a gente não imagina que pode acontecer, felizmente fiquei até mais tarde naquele dia. Primeiro filho, Claudineia tentou engravidar durante um ano. Arthur tinha acabado de ser recebido pelas pediatras e já estava respirando entubado. Seguiu-se um momento de extrema tensão no centro cirúrgico, pois era necessário drenar os dois pulmões do bebê, um deles perfurado pela bala, por causa de uma hemorragia, e o outro porque havia ar fora do pulmão. Mas só havia um dreno torácico: – Primeiro, colocamos o dreno no tórax esquerdo, que tinha uma ferida significativa. Então descobrimos que não havia outro dreno. A equipe de enfermagem percorreu o hospital todo procurando. Tivemos que improvisar, usando um tubo orotraqueal – conta Miller, filho do também cirurgião Eugenio Miller, primeiro chefe da cirurgia do hospital, onde trabalha até hoje: – A gente vê o bebê reagindo, tentando respirar. Não falo isto com orgulho, falo com lástima, mas às vezes temos que fazer o impensável para salvar a vida de um paciente. Nunca drenei alguém tão novo. Na verdade, não sei se algum médico já tinha feito isso, é uma situação muito rara, típica de medicina de guerra. Antes de ser transferido pelo Corpo de Bombeiros para o Hospital Estadual Adão Pereira Nunes, a três quilômetros de distância, Arthur precisou passar por tomografia torácica e craniana, pois o tomógrafo do Adão estava com problemas. Também não havia nenhum dos 16 leitos de UTI neonatal disponível, mas a unidade, referência no atendimento de alta complexidade a recém-nascidos, deu um jeito: a criança que se encontrava em melhor estado de saúde, sem nenhum risco, foi levada para a unidade intermediária neonatal, no mesmo hospital. E foi assim que, às 23h, o bebê entrou no segundo hospital de sua vida: – Imediatamente trocamos o dreno que havia sido improvisado e já estava obstruído. Foi um trabalho incrível feito pela equipe do Moacyr do Carmo. Eles conseguiram estabilizar um recém-nascido sem os dois pulmões funcionando com grande rapidez, mesmo sem equipamento adequado – disse o médico Eduardo de Macedo Soares, de 35 anos, coordenador médico da UTI neonatal do Adão Pereira Nunes.”

No dia 10 de agosto, data agendada pela SOPERJ para comemorar o dia do pediatra, a Sociedade conferiu menção honrosa às três pediatras que assistiram ao Arthur na sala de parto, ao cirurgião que drenou seu tórax, e ao pediatra coordenador médico da equipe da UTI neonatal que recebeu o bebê. As pediatras são Cláudia Teixeira Trannin, Gláucia Martins Pereira Debernardo e Jaqueline Miguez Salles.

Foi uma cerimônia emocionante para todos. Memorável! Digna e adequada à comemoração do nosso dia.

A alegria às vezes vem junto da tristeza, mesmo quando o final não é feliz, mas estão envolvidos solidariedade e compromisso com a vida. Que se refletiram no trabalho competente, sério, e porque não dizer, amoroso, destes médicos. E, afinal, pudemos comemorar o dia do pediatra com orgulho e emoção.

A SOPERJ responde com flores!

Editorial redigido pela pediatra Isabel Rey Madeira, presidente da SOPERJ, e pelo pediatra Eduardo, chefe da UTI neonatal do Hospital Adão Pereira Nunes.