Depressão na infância e na adolescência.

A depressão tem se tornado cada vez mais freqüente e mais grave no mundo, inclusive em crianças e adolescentes. Muitas vezes, o problema não é reconhecido, com terríveis conseqüências para a vida das pessoas atingidas, podendo chegar à morte por suicídio. É fundamental que pais e educadores identifiquem e tratem a situação o mais rápido possível. Ao mesmo tempo, torna-se imperativo refletir sobre as más condições de vida da juventude na sociedade atual e sua influência no surgimento da depressão e de outras perturbações psíquicas. Não se deve confundir a depressão com as tristezas e irritações comuns, decorrentes de perdas ou frustrações do dia-a-dia.

 

A depressão é um estado contínuo e duradouro (por semanas ou meses) de tristeza ou irritabilidade, acompanhadas de falta de interesse e prazer em quase todas as atividades, perturbações do sono, mudança de peso (aumento, diminuição ou, no caso de crianças, incapacidade de ganhar o peso esperado), indecisão, falta de concentração, pensamentos de morte, tentativas de suicídio, agitação, ansiedade, lentificação dos movimentos, cansaço, falta de energia, sentimentos de desvalorização e culpa. Nem todas as pessoas deprimidas apresentam todos estes sintomas, e a intensidade também varia.

 

Em crianças e adolescentes, as manifestações da depressão vão depender da idade, mas em todas as faixas etárias ocorrem fracasso escolar, abandono de atividades esportivas e de lazer, e dificuldades de relacionamento com os colegas e a família. Abaixo dos sete anos, é necessário observar a expressão facial e corporal, porque a criança não consegue descrever o que está sentindo. São comuns nesta fase a inquietação, o isolamento, a recusa de comer, problemas de sono e choro fácil. Crianças mais velhas se queixam de tristeza, pensamentos ruins, dores de cabeça e de estômago, e se referem a si mesmas de forma negativa: "eu sou burro", "ninguém gosta de mim", "tudo na minha vida dá errado". Caracteristicamente, estão tristes, irritadas, chorosas, têm movimentos lentos e voz monótona. Também ocorrem regressões a comportamentos já ultrapassados, como chupar o dedo, urinar na cama, falar como bebê, etc.

 

Em adolescentes, a depressão geralmente se manifesta por desesperança, comportamentos agressivos ou de delinqüência, ganho de peso e aumento do número de horas de sono. Há propensão ao abuso de álcool e drogas, condutas perigosas, e tentativas de suicídio. O que causa a depressão? Não há uma causa única, mas uma conjunção de fatores. Muitas vezes já se nasce com uma tendência geneticamente determinada para a depressão (são comuns casos semelhantes na família), que vai se manifestar ou não, dependendo das experiências ao longo da vida. Pessoas que durante os primeiros quatro anos sofreram afastamentos dos pais, ou tiveram cuidadores distantes e sem afeto, estão em maior risco de apresentarem a condição em algum momento de suas vidas. Pais agressivos, que brigam entre si, utilizam castigos severos, rejeitam e ridicularizam os filhos também aumentam as chances de que os mesmos tenham depressão. Os desencadeadores da depressão na infância são geralmente situações de perda, como a morte de um dos pais, a separação do casal, a mudança de casa ou de escola, ou o nascimento de um irmão. Como tratar a depressão? Uma vez que os pais suspeitem que seu filho apresenta o problema, devem procurar um psiquiatra da infância, para que seja feito o diagnóstico. O tratamento se realiza através de psicoterapia, orientação aos pais, e o uso de medicações específicas. Pode-se supor que fatores culturais tenham grande influência no aumento do número e da gravidade dos casos de depressão. O modo de vida contemporâneo têm privado as crianças do cuidado dos pais, cada vez mais atarefados e sem tempo para seus filhos. Além disto, cobranças de desempenho, atividades exageradas, estímulo à competitividade e falta de tempo para brincar têm encurtado a infância.

 

É importante que os pais estejam atentos à qualidade de vida que estão proporcionando a seus filhos, para que não favoreçam o surgimento de transtornos mentais como a depressão. * Médico psiquiatra, presidente do Comitê de Saúde Mental da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro (SOPERJ), membro do Departamento de Saúde Mental da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), chefe do Serviço de Saúde Mental do Hospital Municipal Jesus, Rio de Janeiro.