Sonho Olímpico

“Há um menino, há um moleque
Morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto balança ele vem pra me dar a mão

Bola de meia
Bola de gude
O solidário não quer solidão
Toda vez que a tristeza me alcança um menino me dá a mão

E me fala de coisas bonitas que eu acredito
Que não deixarão de existir
Amizade, palavra, respeito, caráter, bondade, alegria e amor.”

Trecho da música Bola de Meia, Bola de Gude, de Milton Nascimento e Fernando Brant

Sonho Olímpico

As Olimpíadas de Tóquio têm proporcionado momentos de emoção e reflexão para nós, pediatras. Que profissional, ao ver as imagens do pódio de Street Skate feminino, não pensou: “que orgulho dessas crianças!”.
Até chegar ali e ocupar um daqueles lugares no pódio, foram muitas histórias envolvidas. Histórias que passam por sonhos, adversidades, força de vontade, dificuldades e até sofrimento.
Quantas meninas e meninos foram motivados pelo encantamento de ver Rayssa Leal, nossa atleta de apenas 13 anos, se divertindo, mas muito concentrada em sua missão e no seu sonho?
As histórias são inspiradoras. É o menino que começou surfando em prancha de isopor e ganha medalha olímpica; a menina negra que andava a pé por quilômetros, para chegar ao seu local de treino, e se torna a primeira atleta brasileira a ganhar duas medalhas na ginástica artística.
Nosso objetivo na pediatria não é transformar nossos pacientes em atletas de alto desempenho, mas vendo as Olimpíadas, ou a Copa do Mundo, e o impacto que essas competições geram nas crianças, precisamos surfar nessa onda e estimular a prática de exercícios físicos.
Muitas vezes pais ou cuidadores alegam que não têm condições de levar seus filhos para praticar um esporte. Ou que não existe disponível no bairro onde moram um local onde os filhos possam se exercitar. Devemos acolher essas dificuldades e buscar, junto com as famílias, alternativas para que as crianças e adolescentes consigam realizar atividades físicas.
Este é um ótimo momento para ressaltar a importância do esporte e alertar pais e responsáveis para a dependência das telas. Essa é uma questão tão séria que o CID – 11 terá uma classificação para “vícios em videogames”.
Associado à questão, também é preciso alertar pais e responsáveis para essa onda perigosa de “desafios” na Internet, prática extremamente perigosa para nossas crianças e adolescentes e que tem resultado em histórias com desfechos muito tristes.
Devemos ressaltar o quanto o contato presencial das atividades esportivas estimula relações interpessoais mais saudáveis, facilita a observação de adultos para ajudar as crianças a construírem a noção de comunidade e solidariedade.
Quantas vezes vimos um atleta parar sua atividade para ajudar outro que caiu a se levantar? Ou o jogador de vôlei que cruza a quadra para pedir desculpas pela bolada no rosto do adversário? É este o influencer que queremos para nossas crianças e adolescentes e não aqueles que enaltecem desafios online ou a dieta da moda.
Aliás, falando em dieta da moda, é sempre bom ressaltar que os exercícios físicos ajudam a combater de forma mais eficaz a triste estatística de 15,2% a 29,1% dos adolescentes com excesso de peso, pois atuam na prevenção do quadro e no tratamento.
Sabemos que uma estratégia de saúde pública que pretenda combater essa realidade e reduzir esses números tem que passar por atividades físicas e de bem-estar mental.
A Constituição e o ECA preveem o direito dos jovens ao acesso a esporte, diversão e lazer, entre outras coisas. Deveríamos lutar por espaços para essas crianças simplesmente se movimentarem.
A obesidade é uma “pandemia” que estamos combatendo há anos, apesar de termos uma vacina simples e que pode estar ao alcance de todos: o exercício físico.
De acordo com o manual de orientação Promoção da Atividade Física na Infância e Adolescência, da SBP, “ser fisicamente ativo todos os dias é importante para a promoção da saúde integral de crianças e adolescentes. É fundamental que as atividades sejam prazerosas e adequadas ao estado individual de crescimento e desenvolvimento da criança/adolescente”.
No entanto, existe a alegada dificuldade moderna: a falta de tempo. Mas nós, pediatras, precisamos pensar estratégias para ajudar essas famílias a introduzirem exercícios físicos no dia a dia de crianças e adolescentes.
Pesquisar e conhecer locais que promovam atividades físicas, ou parques próximos aos nossos locais de atendimento. Devemos incluir na anamnese perguntas sobre atividades físicas, uma vez que cada faixa etária tem sua intensidade e exercícios recomendados.
Devemos ainda e, principalmente, envolver a família na questão esportiva, assim como na educação escolar. Deixar claro que é apenas uma educação diferente, com uma sala de aula maior.
Não importa se é em um clube chique ou em uma quadra improvisada. O esporte pode mudar o futuro, nem que seja para formar crianças mais saudáveis. Precisamos deixar claro para as famílias o quanto esse comportamento é fundamental.
Que tal aproveitarmos toda essa motivação das Olímpiadas e das Paraolimpíadas para pensarmos em saúde, inclusão e superação dos nossos pacientes? Que essas competições também nos inspirem no dia a dia da nossa profissão.

 

Katia Telles Nogueira – Presidente

Cássia Freire Vaz – Diretoria de Relacionamento com o Associado

SOPERJ – Triênio 2019 – 2021