1. Introdução
Você pergunta aos pais de seus pacientes quanto tempo essas crianças despendem na frente de um videogame, smartphone, tablet, computador ou TV/DVD? Você pergunta se eles sabem quais videogames são utilizados? Eis questões relevantes para o pediatra no século XXI.
Pais e educadores preocupam-se com o tempo que as crianças passam jogando videogames (uma boa tradução é “jogos eletrônicos”) ou utilizando diferentes tecnologias para se conectar às redes sociais ou trocar mensagens de texto e fotos entre si. Essa preocupação parece ser oportuna, pois uma pesquisa realizada em 2008 observou que norte-americanos de 2 a 18 anos de idade utilizavam videogames e outras mídias por um período médio de 7 horas diárias.1Outra pesquisa realizada pelo Ibope mostrou, em maio de 2012, que as crianças brasileiras permaneciam conectadas à Internet por cerca de 17 horas, superando as crianças europeias e norte-americanas.
Entretanto, o tempo que uma criança passa em frente à TV/DVD seria tão importante assim? Em primeiro lugar, depende da idade, pois sabemos que, nos primeiros 2 anos, o contato direto com os pais e os entes queridos é crucial. É fato que a TV/DVD funciona como uma espécie de babá gratuita em muitos lares e substitui a interação humana, que é fundamental para um crescimento cerebral saudável.1 Além disso, alguns estudos demonstraram que o atraso na aquisição da linguagem esteve associado à exposição de menores de 18 meses de idade à TV/DVD.
Outro argumento contra o uso liberado da TV e de outras mídias diz respeito ao fato de que o conteúdo de seriados, propagandas, filmes, redes sociais, mensagens de texto etc. influencia o modo como as crianças percebem o ambiente, como se relacionam com os demais e como encaram certos comportamentos de risco.2 De modo semelhante, inúmeros estudos científicos mostraram que a exposição à violência na mídia aumenta o risco de comportamento agressivo em certas crianças e adolescentes.1
Para os pediatras que se divertiam com joguinhos inofensivos como, por exemplo, o Pac-Man, as preocupações podem parecer exageradas. Contudo, precisamos ter em mente que, nesses 40 anos de evolução, os videogames se sofisticaram a tal ponto que é possível participar de disputas com múltiplos jogadores espalhados no mundo inteiro. Muitos games atuais exigem a interação entre os jogadores, o envio de informações pessoais e a exata localização de cada um. Há também os chamados role-playing games (RPG), os quais têm maior poder viciante e cujo jogador assume o lugar virtual de um personagem na trama.
A relevância desse assunto refletiu-se na publicação recente da quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), que incluiu o internet gaming disorder (transtorno pelo uso compulsivo de games na Internet) entre os transtornos que exigirão estudos adicionais para eventual classificação entre os transtornos clínicos estabelecidos.
Figura 1 Um lactente de cinco meses já se deixa hipnotizar pela TV. O “Ministério da Criança” adverte: a TV faz mal à saúde de menores de 2 anos.
2. Sinais de alerta
Por um lado, os videogames e os infinitos recursos da Internet são conquistas tecnológicas que podem expandir as atividades de uma criança e tornar sua vida mais divertida; por outro lado, oferecem inúmeras chances de uso indevido e acesso a situações nocivas ou mesmo perigosas. Como exemplo, podemos citar a prática de cyberbullying nas redes sociais, que já produziu muitos casos de transtornos psiquiátricos e até mesmo suicídio entre os jovens.
O pediatra pode inserir na anamnese perguntas dirigidas à detecção de sinais e de sintomas referentes ao uso abusivo de videogames e de outras tecnologias. Qualquer um destes achados deve suscitar uma avaliação mais detalhada: retraimento social, irritabilidade, agressividade, ganho ponderal excessivo, baixo rendimento escolar ou perturbações do sono (adaptado da referência 3).
3. Sistemas de classificação dos videogames
Vale a pena orientar os pais sobre os sistemas de classificação disponíveis dos games. A capa de todo videogame exibe um símbolo no canto inferior esquerdo, que provém da classificação brasileira ou norte-americana. O sistema brasileiro é simples e autoexplicativo: uma letra L sobre um quadrado verde denota que o jogo é livre, ou os números 10, 12, 14, 16 ou 18 assinalam a idade mínima de uso. A classificação norte-americana foi criada pela Entertainment Software Rating Board (ESRB). A ESRB é uma organização sem fins lucrativos fundada em 1994 pelos produtores de videogames em resposta às fortes críticas dirigidas contra games cada vez mais violentos e impróprios para menores. Esse sistema utiliza um de sete símbolos:
Earlychildhood. O conteúdo do videogame é próprio para crianças maiores de três anos.
Everyone. Adequado para todas as idades.
Everyone 10+. Adequado para crianças a partir de 10 anos de idade.
Teen. Adequado para adolescentes a partir de 13 anos. Pode conter alguma violência, humor grosseiro, quantidade mínima de sangue e/ou uso infrequente de palavrões.
Mature 17+. Adequado para adolescentes a partir de 17 anos. Pode co