Doença celíaca

A primeira descrição de uma condição que se assemelha à doença celíaca (DC) vem de 200 anos antes de Cristo, feita por Arateus da Capadócia. Em 1888, Gee fez a primeira descrição clínica detalhada da “afecção celíaca”. Desde então, inúmeras descrições da doença têm sido feitas. Os avanços na compreensão da fisiopatologia, do diagnóstico e das associações da DC têm sido inúmeros.
Desde a primeira descrição da transformação característica da mucosa intestinal feita por Benecke em 1910 passando pela hipótese de Dick de que seriam certos grãos que causariam a lesão da mucosa, até chegarmos hoje a uma melhor compreensão genética, quando foram descritos os antígenos teciduais HLD Q2 por Solid e colaboradores e os marcadores sorológicos: anticorpos antigliadina (IgA e IgG) antiendomísio IgA e antitransglutaminase tecidual. A DC não é uma doença alérgica mediada por IgE.
Apesar dos marcadores sorológicos, o diagnóstico da doença celíaca ainda passa obrigatoriamente pela biópsia jejunal, que se apresenta com atrofia vilositária. O diagnóstico diferencial da atrofia vilositária passa pelo estudo ótico histológico da mesma com colorações pela hematoxilina e eosina para estudo morfométrico, pela coloração de Giemsa para estudo de possíveis agentes patogênicos e pelo PAS para pesquisa de agente patogênico e quantificação da celularidade na mucosa.
A classificação de Marsh tem sido largamente utilizada para a confirmação do diagnóstico.
Utiliza-se a relação entre vilosidade (V) e cripta (C)
Grau
I Mucosa normal: relação V/C > 2
II Atrofia vilositária parcial: relação 1 ≤ V/C ≤ 2
III Atrofia vilositária subtotal: relação V/C < 1 IV Atrofia vilositária total: desaparecimento total das vilosidades com um aspecto de mucosa plana


Dentre os exames laboratoriais, os anticorpos antigliadina e antiendomísio demonstraram ser os mais importantes no rastreamento da DC. Em trabalho recente, Troncone e Ferguson demonstram em algumas séries estudadas que a sensibilidade destes testes encontra-se entre 55 e 100% e a especificidade entre 42 e 100%. Uma variação muito grande.
A conclusão a que se chegou com estes estudos é que a sensibilidade, especificidade e os valores preditivos positivos e negativos destes testes não são ideais para que se possa fazer o diagnóstico de definitivo de DC. A associação deles com outros testes tem sido usada na tentativa de se criar um padrão que possa, com certeza, afirmar que um paciente tem DC ou, pelo menos, de fazer um rastreamento em pacientes suspeitos, sem se lançar mão da biópsia jejunal.
Anticorpos antitransglutaminase tecidual são considerados um novo, altamente sensível e específico, marcador para DC e por ser uma técnica relativamente barata, deverá substituir os anticorpos antiendomísio tradicionalmente utilizados nos screenings populacionais.
Para estudos populacionais é o teste de escolha quando comparado à antigliadina e antiendomísio Permite o diagnóstico da DC com alta sensibilidade e especificidade. Por ser quantitativo não sofre a intervenção do observador.
Além destes testes, a alergia ao glúten (sem ser DC) pode estar presente e o aumento de IgE específica para trigo e/ou gliadina pode ser de ajuda no diagnóstico diferencial entre DC e alergia ao trigo.
A coexistência de DC e alergia a cereais parece ser muito rara.
Esquematicamente, o diagnóstico diferencial da Doença Celíaca segue as etapas mostrada no gráfico 1.
Com o advento dos marcadores sorológicos foi possível estabelecer a associação de DC com outras afecções (Ver tabela 1).
José Cesar da Fonseca Junqueira
Membro do Comitê de Gastroenterologia da SOPERJ