Os velhos e falsos amigos… de novo?

Se existisse um assunto tetracampeão — Entschuldigung— nesta coluna, seria o dos falsos amigos. Você está entre aqueles médicos de boa índole, ávidos de conhecimento, que leem artigos científicos em inglês e juram que grip é “gripe” e rubeola é “rubéola”? O consolo é que não estamos sós, pois somos mais de 400.000 médicos brasileiros. Todos tendemos a escorregar nesses termos maliciosamente parecidos com o português, mas de sentido bem diferente daquele que nossos cérebros ingenuamente atribuem.
 

Talvez porque o português seja uma língua tão sonora, somos induzidos a priorizar os sons das palavras em detrimento do significado. Um exemplo: durante minha residência em Pediatria, eu estava segurando uma criança para que dois médicos realizassem um ecocardiograma. Durante o exame, um deles falou: “Frisa a tela”. Pensei com meus botões: “Será possível frisar ainda mais essa imagem?” O mistério se desfez quando o outro médico apertou o botão “Freeze” do equipamento, e a imagem congelou-se.

Em recente congresso nacional de especialistas, ouvi uma explicação estranha proferida por um excelente geneticista. Tenho certeza de que a jovem residente que o inquiriu ficou ainda mais confusa com a resposta dele. Tudo porque o palestrante insistiu em utilizar a expressão “mutação de novo”.Quando o estudante americano lê ou ouve o termo de novo mutation, “de novo” soa como grego para ele, mas na verdade é latim. Esse termo significa “mutação nova”, ou seja, uma mutação que não foi transmitida ao indivíduo pelos pais. Diante do termo desconhecido, o estudante americano não é induzido ao erro.

Nestas latitudes tropicais, a tradução “sonora” do falso amigo por “mutação de novo” é fatal para o aprendiz porque o leva para o extremo oposto do significado verdadeiro.Já encontreiessa tradução em textos com “de novo”escrito em itálico, mas como não é possível falar em itálico… Esperem!Tenho uma sugestão para os professores e palestrantes deste imenso Brasil: aceito que continuem a falar “mutação de novo” desde que “de novo” seja pronunciado em falsete.Treinem em casa!
 

P.S. – Não seria mais fácil utilizar a expressão“mutação nova”?